O dia 14 de Março é o Dia Mundial de Luta contra as barragens.
Em vista disso, diversas entidades da APEDeMA-RS (Assembleia Permanente das Entidades de Defesa do Meio Ambiente do RS), da qual o Instituto Orbis é parte integrante, e a própria APEDeMA como um todo, entrou ao Exmº Sr. Governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, o documento transcrito abaixo.
As barragens são um dos eventos de maior impacto ambiental e social que o ser humano tem sistematicamente construído, em nome não apenas dos seus próprios fins, como fornecer água a uma população ou produzir energia elétrica.
Tanto um modelo de barragem quanto o outro (água potável ou energia elétrica) as barragens são extremamente danosas ao ecossistema da sua região. Onde antes as águas corriam soltas, livres e rápidas, passam, após o barramento concluído, a ser lentas. Isso faz toda diferença.
Nos locais de águas rápidas, todas as espécies que constituem aquele ambiente, aquele ecossistema, são adaptadas a esse tipo de configuração local. Peixer, por exemplo, de águas rápidas, não se desenvolvem em águas lentas, o que ocorre após a formação do lado da barragem. O mesmo acontece com os invertebrados. Atrás desses invertebrados existe uma infinidade de outras espécies que os procuram para alimentar-se, como aves, répteis, anfíbios, enfim, a biota (conjunto de seres vivos de um local ou região) que compõe aquele ecossistema. As barragens têm outro grande problema: seus efeitos são muito duradouros.
E ainda teríamos uma extensa gama de profungos problemas para listar em relação aos próprios seres humanos. Aqueles que moravam nos locais de alagamento são, simplesmente, destituídos de suas moradias e seus afazeres, além de toda sua história.
Abaixo o documento entregue:
_________________________________
Porto
Alegre, 14 de março de 2012
Excelentíssimo
Senhor Governador Tarso Genro,
“Oba!
viva! veio a enchente
O Uruguai transbordou
Vai dar serviço pra gente
Vou soltar minha balsa no rio
Vou rever maravilhas
Que ninguém descobriu
O Uruguai transbordou
Vai dar serviço pra gente
Vou soltar minha balsa no rio
Vou rever maravilhas
Que ninguém descobriu
Amanhã eu vou embora pros rumo de
Uruguaiana
Vou levando na minha balsa cedro, angico e canjerana
Quando chegar em são Borja, dou um pulo a Santo Tomé
Só pra ver as correntinas e pra bailar um chamamé
Se chegar ao salto grande me despeço deste mundo,
Rezo a Deus e a São Miguel e solto a balsa lá no fundo
Quem se escapa deste golpe, chega salvo na Argentina
Só duvido que se escape do olhar das correntinas “
Vou levando na minha balsa cedro, angico e canjerana
Quando chegar em são Borja, dou um pulo a Santo Tomé
Só pra ver as correntinas e pra bailar um chamamé
Se chegar ao salto grande me despeço deste mundo,
Rezo a Deus e a São Miguel e solto a balsa lá no fundo
Quem se escapa deste golpe, chega salvo na Argentina
Só duvido que se escape do olhar das correntinas “
(Balseiros do rio Uruguai- Barbosa Lessa)
O Rio
Uruguai é um elemento importantíssimo para a identidade regional. O rio
está muito presente e enraizado na memória coletiva Gaúcha, como ilustrou
Barbosa Lessa, enquanto um curso d’água de corredeiras, ornado de florestas, de
cheias e baixas sazonais, que desafiava, em sua doma, os antigos balseiros.
Mesmo assim, dele dependem ribeirinhos, pescadores, camponeses e suas
agriculturas, e piracemas e os animais silvestres, em suas travessias. Hoje em
dia, partes do Rio “Uruguay” e seus tributários já não contam com tantas de
suas belezas, presentes nas nossas músicas, histórias e poesias. Ele já não é
mais livre para correr, na sua dinâmica natural de cheias e baixas, pois tem
seu volume e ciclos alterados por 6
grandes hidrelétricas que existem ao longo da bacia deste rio. Em diversos
pontos do rio, hoje, pairam lagos, praticamente
mortos, com águas paradas, sem os peixes característicos (dourado, grumatã,
surubim, etc.) e sem a oxigenação de suas corredeiras. Mas o dourado, as
corredeiras, as florestas, os pescadores e campesinos ainda vivem no rio
Uruguai!
O ponto de saturação de empreendimentos
hidrelétricos é uma realidade. Não é mais possível tantas barragens,
impedindo o curso livre de um rio, matando a paisagem natural e a
biodiversidade. Toda vez que há um leilão para definir o consórcio que irá
construir um novo empreendimento em sua bacia, sentimos como se nosso Rio
Uruguai estivesse sendo, ele mesmo, leiloado. E isso, infelizmente, está se
tornando regra no Brasil. E para que e para quem servem essas barragens?
As usinas
hidrelétricas são formas “baratas” de se obter energia, principalmente
porque sua forma de produção serve ao parque exportador de matérias primas (commodities,
como ferro, alumínio, cimento, etc.) de gigantescas
empresas do Setor Elétrico, que
usam a própria natureza do rio para seus lucros. Essas concessionárias têm sua
construção financiada por dinheiro público (BNDES) (resultado, portanto, do
FGTS) e, de quebra, recebem concessões de energia gerada, por até 30 anos! Ou
seja, recebem muitos dividendos, produzindo muito pouco para o desenvolvimento
do País e para a redução dos custos de vida do trabalhador. O preço da energia
para elas é subsidiado, sendo quase dez vezes menor do que o preço pago
pela população, e, ainda por cima, são levados daqui nossos recursos naturais,
a preços ínfimos.
O complexo
Garabi-Panambi (Brasil/Argentina), se levado a cabo, poderá afetar mais
de 50 mil pessoas, inundando áreas importantíssimas de 22 municípios
(Alecrim, Dr. Mauricio Cardoso, Novo Machado, Porto Mauá, Santo Cristo,
Tucunduva, Tuparendi, Crissiumal, Derrubadas, Esperança do Sul, Tiradentes do Sul,
Garruchos, Santo Antonio das Missões, São Nicolau, Pirapó, Roque Gonzales,
Porto Vera Cruz, Porto Lucena e Porto Xavier). Em Derrubadas, temos o Parque Estadual do Turvo, e com a usina
de Panambi, pelo menos 10% (1.750 ha) do parque seriam destruídos,
representando mais de 2 milhões de árvores (quantidade maior do que toda
a arborização de Porto Alegre.), além de afetar irreversivelmente o Salto do
Yucumã, o maior salto longitudinal do mundo. Isso resultaria numa
significante perda para a unidade de
conservação florestal mais antiga e importante do Rio Grande do Sul,
único local do estado que ainda abriga espécies ameaçadas como a onça, a anta,
o tapiti, entre outros.
No vale
do rio Pelotas (nascente do Uruguai), a maior ameaça é representada pela Hidrelétrica
de Pai-Querê (292 MW), transformando mais de 100 km de rios com corredeiras
em águas paradas. Poderia causar extinção de dezenas de peixes e
organismos de águas correntes, e provocar perda de 4 mil hectares de
florestas com Araucária, no último habitat do queixada (Tayassu pecari).
É bom
lembrar que o alto impacto socioambiental, da maior parte dos grandes
empreendimentos hidrelétricos,
envolve um alto nível de exploração dos trabalhadores da construção da
barragem, na maioria das vezes, vindo de regiões distantes, os quais não
têm seus direitos trabalhistas assegurados. Há denúncias de trabalho
escravo nos próprios canteiros de obras das represas e também denúncias
de exploração sexual, nas redondezas das obras, para acalmar grande
número de trabalhadores distantes de suas famílias.
Embora o Brasil tenha passado por diversas mudanças
positivas no contexto das leis ambientais, desde a década 1970, as mesmas são
desconsideradas nos empreendimentos em implementação pelo governo atual, uma
vez que estes são pautados, em sua maioria, pelos projetos do regime
militar. E isso
tudo ocorre na “ante-sala” da Rio +20...
Necessitamos
de Áreas Livres de Barramentos e Respeito aos avanços da Legislação Ambiental
Brasileira e proteção dos Direitos Humanos! Precisamos Rediscutir a Matriz
Energética Brasileira e para onde vai esta energia, buscando as alternativas de
geração realmente mais sustentáveis, defendendo os ribeirinhos e a
biodiversidade de nossos rios, para continuarmos a cantar as belezas das
paisagens e transmitir a cultura das populações que habitam a região da Bacia
do Rio Uruguai e outras regiões brasileiras.
Respeitosamente
Apedema – Assembléia Permanente de Entidades em Defesa do Meio Ambiente - RS
GTUP – Grupo de Trabalho Universidade Popular
MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens
InGá – Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais
AGAPAN – Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente
Natural
ASPAN – Associação São-Borjense de Proteção ao
Ambiente Natural
Comitê Gaúcho em Defesa da
Biodiversidade e do Desenvolvimento Sustentável
NAT/Brasil – Núcleo Amigos da
Terra/ Brasil
Mira Serra/Projeto Mira-Serra
CEA- Centro de Estudos Ambientais
UPAN -
União Protetora do Ambiente Natural
Instituto
Orbis
Grupo Maricá
MoGdema – Movimento
Gaúcho em Defesa do Meio Ambiente
Levante Popular da
Juventude
União da Juventude
Comunista
Juventude Comunista
Avançando
Juventude LibRe –
Liberdade e Revolução
Movimento Rio Uruguai Vivo
Diretório Acadêmico do Instituto de Biociências -
UFRGS
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